Preâmbulo
Caro leitor:
Nesta história estamos
apresentando uma aula de Tia Neiva aos Médiuns do Templo do Amanhecer, que
trouxe a maior soma de elucidações em torno de nossas relações com o mundo
invisível.
A história de Maria Lúcia, a
mocinha que morreu devido a uma dose excessiva de drogas, quando ainda
envergava seu vestido de noiva é uma história como muitas outras que
acontecem todos os dias.
Ela se torna esclarecedora
devido à riqueza de detalhes que ela nos consegue transmitir. Esses
detalhes irão nos permitir analisar melhor as nossas relações com esse
mundo que nos cerca.
É bom que a gente se lembre a
priori, que o mundo invisível, o mundo etérico, o Plano, ou melhor, os
Planos em que se acham os Espíritos que deixaram o corpo físico, são
apenas mundos invisíveis, imperceptíveis aos nossos sentidos e aos nossos
instrumentos científicos.
São mundos ou Planos
invisíveis, mas são físicos, moleculares e atômicos. São mundos de formas,
de sensações, de relacionamento e muito mais povoados do que o nosso mundo
físico.
É bom também que a gente saiba
que nossas relações com esses mundos não são feitas à nossa revelia, mas,
dentro do âmbito de nosso livre arbítrio, presente ou passado.
E é importante também que saiba
que o contato com esses Planos se faz através de uma energia física que se
chama ectoplasma ou fluído. Essa energia por sua vez é produzida em nosso
organismo físico, em nosso corpo. O mecanismo dessa produção e contato se
chama Mediunidade e por fim, que todos os seres humanos são Médiuns, pois
todos os seres humanos produzem ectoplasma.
A Noivinha Desencarnada
Um domingo quente de dezembro.
No Templo do Amanhecer os Médiuns aguardam pacientes a chegada de Tia
Neiva. Os Mestres exortam-nos a se Mediunizarem e se tornarem receptivos à
palestra que irá se realizar daí a poucos minutos. A Clarividente chega,
toma seu lugar junto ao microfone e o silêncio é completo. Ela os olha
sorridente e começa:
Meus filhos, Salve Deus!
Eu nem bem acabara de contar a
vocês a história do Sargento recém desencarnado, quando ouvi uma voz
chorosa que me chamava no Plano Invisível. Olhei e deparei com uma jovem
vestida de noiva que segurava seu buquesinho de flores com ar humilde e
constrangido.
Senti que meu coração apertava
e solícita, indaguei o que ela queria de mim. Ela me olhou com o ar mais
doce deste mundo e me disse:
“Tia Neiva, meu nome é Maria
Lúcia e sou um Espírito que teve a felicidade de passar aqui pelo Templo
do Amanhecer depois de ter sofrido muito. Apresento-me com meu vestido de
noiva porque foi assim que desencarnei. Ouvi a senhora contando a história
do Sargento para seus Médiuns e gostaria muito de contar também a minha
vida para a senhora e os Médiuns do Vale”.
Olhei para Mãe Yara e ela fez
sinal de que consentia. Vi então o quadro de Maria Lúcia e percebi que de
fato a história dela iria servir muito para vocês. Então a convidei para
vir hoje e ela está aqui do mesmo jeitinho que a vi pela primeira vez: o
vestido branco, o véu, o buquesinho e o corpinho esguio. Seu ar reflete um
pouco de angústia, mas, seu olhar hoje está firme. Ela está ansiosa para
que vocês saibam a história de sua vida. Como vocês não podem vê-la, nem
ouvi-la, eu vou contando o que ela me diz. Enquanto isso Mãe Yara vai me
ajudando a ilustrar os episódios com sua Doutrina.
Meu nome é Maria Lúcia – diz
ela – e eu morava no Rio de Janeiro junto com meu irmão e meus pais.
Éramos uma família modesta, mas eu gostava de andar em companhia de jovens
de melhor situação. Com isso eu fazia meus pais sofrerem muito, pois vivia
exigindo coisas que eles não tinham condições de me proporcionar. Se não
conseguia o que queria, saía de casa zangada e pousava fora, em casa de
pessoas que às vezes mal conhecia.
Sempre que eles se cansavam
desse jogo e deixavam de fazer os meus gostos, meu lar virava um campo de
batalha. Eles me proibiam de sair por algum tempo e barravam os meus
amigos de entrar em casa. Apesar de se tratar apenas de alguns
desajustados como eu, eles eram chamados por meus pais e os vizinhos de
“hippies”. Quando isso acontecia eu sofria muito, pois as minhas saídas
tinham razões secretas que só eu podia entender. De uma forma ou de outra
os meus desatinos os foram levando à miséria. Com isso tivemos que mudar
para uma casa pobre, de bairro mais pobre ainda. Pouco antes da mudança eu
fui abordada por dois “colegas” já habituados ao meu comportamento e saí
com eles. Permaneci fora de casa três dias.
Voltei quando o “fumo” acabou.
Entrei sorrindo em desafio.
Na sala deparei com meu mano
mais velho, conversando com um amigo seu chamado Marques. Fiquei um pouco
indecisa e percebi que meu irmão vacilava em me apresentar; sentia
vergonha de mim! Mas, mesmo sem apresentação Marques e eu ficamos nos
olhando como se nos conhecêssemos há muito.
Saímos daquele transe com a voz
áspera de minha mãe dizendo exaltada: “Oh, sua cínica desavergonhada, o
que vem fazer aqui, vem para o enterro de seu pai? Por sua causa ele teve
um ataque cardíaco e está entre a vida e a morte!”.
Senti muita vergonha, e pelo
olhar constrangido de Marques vi que estava perdendo uma oportunidade de
ser feliz.
Meu pai? Foi tudo que pude
exclamar e corri para o quarto dele.
Graças a Deus tão pronto ele me
viu começou a reagir contra a doença. Com isso me compenetrei que o
remédio era eu. Pobre papai, pobre mamãe!
Marques continuou freqüentando
minha casa e logo estávamos namorando. Meus pais esperançosos que eu me
casasse incentivavam nosso namoro. Mas não foi preciso muito esforço por
parte deles. Marques e eu éramos Almas Gêmeas e nos amávamos muito, e
assim tudo foi se encaminhando para um enredo feliz.
Estávamos assim na maior
felicidade quando os velhos amigos “hippies” começaram a me procurar de
novo. Eu, porém me sentia muito feliz com Marques e passei a hostilizar os
velhos companheiros de infortúnio. Pensava comigo: eles não passam de uns
desajustados com seus pais, eu, porém tenho pais compreensivos e não
preciso deles!
Com tudo isso eu me sentia
inquieta, não tinha paz. No íntimo eu sabia que meu passado ainda iria me
destruir, apesar da atitude que estava tomando.
Como que adivinhando minhas
preocupações, Marques sempre me dizia: “O dia que você firmar o “papo” com
esses “caras” eu sumo da sua vida!” Com isso minha paz diminuía dia a dia.
Poucos dias antes da data do
meu casamento eles intensificaram o assédio. Um dia eles apareceram e
estávamos conversando na sala. Eu dizia com veemência que não queria
“papo”, que eles fossem embora, que eu ia me casar. Eles apenas sorriam
com certo cinismo. Lucas, um jovem de aspecto agressivo, vestindo uma
calça de pelúcia e um blusão de couro, passou o braço no meu pescoço e
disse: “Que é isso menina? Você está numa de casamento? Tá “doidona”?
Nesse exato momento Marques
assomou na soleira da porta! Eu apavorada desvencilhei-me de Lucas e fui
ao seu encontro. Ele, porém não me deu tempo para explicações e furioso
começou a gritar: “Larguem dela! Vocês já fizeram muito mal a essa pobre
menina! Ela agora é minha noiva! Eu sou diferente de vocês, ouviram? Não
gosto do “papo” nem de “caras” como vocês!”.
Eles saíram e eu meio
desorientada acompanhei-os até a porta.
Voltei para a sala sentindo-me
frustrada, com certo desespero, pensando comigo: Lucas e toda essa
“patota” são gente boa. Eu não devia ter ficado parada, devia tê-los
defendido da ira de Marques. Afinal o que falta a eles é uma oportunidade
como a minha!
E assim o conflito começou no
meu íntimo. Eu não parava de pensar neles e no que poderia ter acontecido.
Cada vez os achava mais “bacanas” e assim em meio à maior confusão,
aproximou-se a data do nosso casamento (1).
Um dia eu estava na rua
procurando encontrar o meu enxoval quando topei com a “patota”. Procurei
mostrar-me cordial, expliquei o que estava fazendo e que iria me casar em
poucos dias. Eles, porém me deram uma grande vaia e disseram que não
faltariam ao meu casamento. Fiquei apavorada com a algazarra deles, embora
soubesse que estavam apenas brincando e não o faziam por mal.
Mais tarde, ao encontrar-me com
Marques lembrei-me do incidente e chorei copiosamente no seu ombro. Tinha
enorme arrependimento do que fizera e roíam-me os maus presságios. Pensava
comigo: Meu Deus será que tenho que pagar pelo que tenho feito aos meus
pais?
Nessa noite tive um terrível
pesadelo. Me vi diante de uma grande mansão e na companhia dos “hippies”.
Lá fora rugia uma tempestade e tinha muito medo. De repente ouvimos fortes
batidas na porta. Eu sabia que era Marques, que viera para me buscar, mas
não abri a porta.
Acordei gritando apavorada pela
minha mãe e ela me acariciando, explicando que eu havia sonhado. Disse-me
também que ela e papai já haviam perdoado os meus desatinos.
Desde essa noite minha angústia
aumentou.
Minha relação com os “hippies”
não era tão simples como parecia.
Em nosso meio prevaleciam os
traficantes de drogas, bandidos perigosos que envolviam a gente. Eles se
aproveitavam de nossas fraquezas e nosso desligamento com a família servia
para incentivar nossos vícios.
O domínio dessa gente é
terrível!
Suas vítimas em geral são
meninos de bem, pessoas boas, que apenas são desajustados no meio em que
vivem, e com isso se tornam presas fáceis para esses malandros (2).
Não contei ao Marques o
encontro que tivera com a turma. Sentia medo, mas me mantinha calada.
Um dia estávamos sentados na
calçada em frente de casa, quando chegou a turma.
Marques olhou-os friamente como
se não os visse.
Eles brincando jocosamente,
disseram que tinham vindo me avisar que iriam comparecer ao nosso
casamento!
Antes que eu ou Marques
pudéssemos dizer alguma coisa, eles já tinham ido.
Marques, visivelmente irritado
virou-se para mim e disse: “Se eles aparecerem em nosso casamento, eu vou
embora e nunca mais você vai saber notícias minhas!”.
Diante daquela ira eu também me
irritei e quase explodi, mas temia chegar ao ponto em que Marques pensasse
que estava arrependida de nosso noivado. Mas, aquela cena faltando apenas
três dias para o casamento, foi horrível (3).
Afinal chegou o dia almejado!
A cerimônia foi linda, com a
igreja toda decorada. Esse Templo ficava num outeiro e o acesso era feito
por uma comprida escadaria.
Saímos sorridentes e nem bem
emergimos quando deparamos com o grupo em frente à escadaria. Assim que
nos viram eles estouraram numa vaia deprimente!
Não pude deixar de registrar
quando eles fizeram referência ao meu vestido de noiva, trazendo a dúvida
quanto à minha pureza.
Na confusão que se seguiu, sem
que nem eu mesma notasse, Marques desapareceu!
Desolada e cheia de vergonha
fui levada para a casa de meus pais. Minha mãe tentava me consolar, mas eu
estava certa que Marques não tardaria a aparecer. Ela perguntou se eu
queria ficar com eles. Eu, porém tentando aparentar uma calma que não
tinha, disse-lhe que iria esperar Marques em casa, na nossa casinha! Ele
talvez estivesse lá me esperando.
Cheguei ao lar tão sonhado, mas
Marques não estava.
Senti então que nada mais me
restava neste mundo, além de morrer, porém uma leve esperança ainda
alimentava meu coração.
Senti tonteiras e recostando-me
num sofá comecei a ter alucinações. Via e ouvia a turma com suas risadas,
os rapazes com suas barbas longas a roçarem em meu rosto e suas mãos
quentes me acariciando. Invadiu-me estranha volúpia, tão intensa que
senti-me impelida a correr para onde eles se achassem naquele momento!
Em meio a essa verdadeira
obsessão, permaneci assim meio acordada, meio dormindo, até o dia
amanhecer.
Despertei confusa e a primeira
coisa que me veio à mente foram as palavras de Marques: “Sumirei de sua
vida, nunca mais você me verá!”.
Tomei então uma decisão. Achei
em minha bolsa algumas drogas, manipulei uma dosagem e ingeri. Tudo que eu
queria era fugir de mim mesma, daquele pesadelo e depois voltar para a
casa de meus pais. Sabia que eles me aceitariam, como sempre me aceitaram.
Confiava a tal ponto na paciência deles que chegava a pensar ser melhor
voltar para eles do que o retorno de Marques. Ele com certeza iria me
maltratar, enquanto que meus pais nunca fariam tal coisa.
Engoli as drogas pensando
nisso, sem nenhuma intenção de morrer.
Oh! Foi horrível! Comecei logo
a “viajar”, porém percebi logo que essa era completamente diferente das
minhas costumeiras “viagens”.
Cheguei a uma cidade escura e
deserta. Apavorada procurei por alguém que pudesse me orientar, quando
subitamente centenas de sinos começaram a tocar. Eram sinos de todos os
tamanhos, de diferentes sons que tangiam adoidados! Minha cabeça já estava
a ponto de estourar, quando vi um homem vestido de romano antigo que se
aproximava de mim.
Seu olhar era bondoso, ele
disse chamar-se Januário e que estava ali para me ajudar. Pegou em minha
mão e me conduziu para uma espécie de praça, cercada por todos os lados.
Os sinos haviam parado como por encanto. Sem que se percebesse, Januário
desapareceu e eu me senti só, completamente só.
O que eu pensara ser uma praça,
era na verdade um bosque de relva verde escura e árvores simétricas.
Naquela terrível solidão
comecei a sentir uma sensação de arrependimento, de coisas que fizera e
outras que deixara de fazer. Não pensava na morte, nem na vida eterna.
Para mim tudo não passava de um sonho, um pesadelo, uma péssima viagem!
Só uma coisa era constante em
meu íntimo: a terrível ânsia de voltar para a casa de meus pais. Mesmo
Marques parecia diluído como uma doce recordação (4).
Eu não tinha religião nem
sentimento religioso. Só pensava em voltar e enfrentar as minhas
dificuldades e ficar à mercê de meu destino.
Saí de meu transe, com o som de
uma voz que parecia sair do ar e me cercava de todos os lados. A voz era
firme e máscula, mas tinha também um tom melodioso.
Dizia ela: “Preparem-se para
voltar para a Terra! – Cuidem de controlar suas vibrações, pois não foi
normal o que lhes aconteceu. Neste momento vocês se acham na Mansão dos
Toxicômanos! Essa passagem que vocês fizeram, deveria ser feita somente
daqui a alguns anos, talvez uns vinte ou trinta anos. É por isso que vocês
não são Espíritos normais, porque desencarnaram antes do tempo. Mesmo
assim vocês não são considerados suicidas. São apenas Espíritos que
desencarnaram antes do tempo previsto. É por isso também que sentem essa
atração irresistível pela Terra, para seus ambientes costumeiros. E para a
Terra vocês terão que ir. Preparem-se para viajar para a Terra!”.
Senti certo alívio quando
percebi que ele se dirigia a outros além de mim, e também notei quando ele
nos chamava de “Espíritos”. Sem dúvida havia outros iguais a mim!
A partir daí perdi a noção de
tempo e de espaço. Meus estados se alternavam entre angústia, saudades,
esperanças e desesperos. Mas não conseguia ver ninguém, embora a voz
continuasse a falar. As palavras eram sempre diferentes, mas o sentido era
o mesmo.
Subitamente percebi que havia
mudado de ambiente. Sem que eu soubesse, eu me movera!
O lugar onde me achava agora
era uma grande plataforma, uma espécie de rodoviária cheia de luzes
opacas, de um lilás que variava em tonalidade. Às vezes as luzes chegavam
a parecer roxas, outras quase brancas.
Encontrei novamente Januário e
me senti mais segura.
Como fizera da primeira vez que
me vira, ele tomou a minha mão e me encaminhou para um edifício enorme. Lá
havia muitas pessoas em atitude de espera de condução. Suas roupas eram
mais ou menos parecidas e para meu espanto vi que estava vestida de noiva,
com buquê e grinalda, do jeitinho que casara!
Nisso ouvi soluços bem perto de
mim. Olhei em torno, mas não vi ninguém com aparência de estar chorando.
Olhei interrogativamente para Januário e ele deu a entender que também
estava ouvindo.
“É a sua mãe que chora” disse
ele.
“Minha mãe? E onde é que ela
está que não a vejo?”.
“Você não a vê nem entende,
como não entendeu os belos sermões que têm sido feitos até agora”.
“Sermões? Não, não estou
ouvindo coisa alguma!”.
“Você não ouve porque suas
células nervosas foram danificadas pelas drogas que ingeriu. Também as
pílulas anticoncepcionais produziram danos no seu sistema nervoso (5)”.
“Meu Deus! disse eu, e agora, o
que faço?”.
“Não se preocupe minha filha,
logo você terá a oportunidade de acertar seus desajustes. Para isso você
será muito ajudada pelo amor que tem pela sua Alma Gêmea”.
Amor, Alma Gêmea; aquela
rodoviária, o romano Januário, tudo era tão diferente do que eu sabia e
conhecia...
No instante seguinte tudo
aquilo havia desaparecido e me vi numa praia que me era familiar. Vi que
Januário continuava ao meu lado e sua presença me dava uma sensação de
irrealidade. Mas a praia era bem real e eu comecei a olhar em torno, como
nos velhos tempos que a freqüentara.
Minha atenção foi despertada
por um casal que brigava em altas vozes. Olhei para Januário e ele me
disse: “Vá e procure apartar essa briga, tente ajudar esse casal e é
possível que isso vá ajuda-la”.
Eu me aproximei do casal
briguento no justo momento em que o homem dava violenta bofetada na
mulher. Ela caiu para trás e eu tentei segura-la. Entretanto atravessou
meu corpo como se eu não existisse e fiquei ali abobalhada, olhando a
mulher caída sem saber o que fazer.
Comecei a sentir grande
sensação de culpa, como se eu fosse uma criminosa, uma agressora. O homem
que agredira estava com a respiração ofegante e tinha os olhos injetados.
Uma pequena multidão se formou em torno e eu fiquei apavorada. Queria
apelar para Januário, mas ele havia desaparecido!
O incidente entretanto
tornou-me sóbria e com isso comecei a me compenetrar da verdadeira
situação. Minha cabeça, porém ainda não se firmava e os pensamentos
rodopiavam. Lembrei-me de Lucas com quem estivera muitas vezes naquela
praia e saí perambulando, conforme caprichos de minha mente atribulada.
Logo percebi que estava fazendo o que sempre fizera: na hora da angústia
eu corria para junto de meus pais!
Senti então certa lucidez, uma
certeza no coração. Sim, voltava para a casa que sempre me acolheu, apesar
de meus desatinos. Só meus pais tinham paciência comigo. Apressei o passo
e em pouco tempo estava em casa.
A primeira coisa que ouvi foram
as palavras de minha mãe que dizia: “Foi melhor assim, minha filha não
podia ser feliz. Ela nunca deixou de tomar aquelas drogas terríveis”.
Gritei então com todas as
minhas forças: “Estou aqui, não vou sair mais, não tomo mais drogas!” –
mas foi em vão, ela não me ouvia!
Permaneci ali durante três
longos anos. Acompanhava meus pais a todos os lugares onde iam, sentava na
mesa com eles, entrava nas conduções e ficava magoada quando não sobrava
lugar para mim.
Às vezes meus pais baixavam até
o meu Plano, em seus Transportes enquanto dormiam. Embora com certa
dificuldade eu conversava com eles. Foi assim que soube que Marques havia
se casado e que estava muito feliz. Mesmo assim sofri muito com isso (6).
Eu vivia numa atmosfera lilás e
muito diferente deles. Não percebia e não entendia muito do que se
passava. Mas estava em casa e isso era tudo o que eu queria (7).
Um dia eles decidiram tirar
umas férias e viajar até Brasília. Como de costume eu os acompanhei e
graças ao trabalho de Januário e outros Mentores, eles receberam um
convite e vieram ao Vale do Amanhecer.
Embora vendo e sentindo tudo
nebulosamente, conseguia perceber o que se passava no Templo. Via aquela
multidão e não distinguia muito quem era desencarnado ou não.
Meus pais esperaram muito
tempo, mas por fim chegaram diante da senhora, Tia Neiva. A senhora
explicou a eles o que se passava comigo e enquanto conversava com eles
falava também comigo. Nunca pude esquecer a doçura de seus olhos e o
grande desejo de me redimir, que invadiu meu coração.
A entrevista chegou ao fim e
ouvi quando a senhora tocou uma campainha e um jovem chamado Batista
atendeu. A senhora pediu a ele que fizesse um trabalho especial para meus
pais e ele os levou ao trabalho de desobsessão, nos “Tronos” dos Pretos
Velhos. A senhora fez um sinal para mim e eu os acompanhei. Enquanto meu
pai esperava, minha mãe sentou-se num daqueles “Tronos”. Não sei se ouvi
alguém do meu Plano dizer, mas o fato é que fiquei sabendo que o nome dos
Médiuns eram Waldeck, o Doutrinador e Flauzíria, a Apará.
Senti-me atraída pela Doutrina
que estava sendo feita e uma sensação diferente invadiu-me toda. Senti que
flutuava e vi que estava sendo carregada numa espécie de lençol alvo, que
mais parecia um colchão de nuvens. As últimas palavras que ouvi foram do
Waldeck fazendo minha entrega aos Mentores.
Senti que me desintegrava num
Plano e me reintegrava noutro. Passara pelo “Portal de Desintegração” e já
estava em outro Plano! Despertei num mundo diferente, iluminado por luzes
opacas e de cores variáveis.
Fui então levada para o “Sono
Cultural”, uma espécie de sonoterapia de desassimilação. Despertei sem
saber quanto tempo havia passado. Ao meu lado estava Januário com sua
roupa romana antiga. Ele sorriu e a primeira coisa que fez foi convidar-me
a visitar os meus pais no Plano da Terra.
Encontrei-os vivendo felizes e
embora um pouco tristes, a memória da filha desencarnada já não era tão
penosa. Eles agora sabiam da verdade e que eu estava em boas mãos. A
visita ao Vale do Amanhecer modificara sua sintonia e sua maneira de ver a
vida. Agora Tia Neiva, eu voltei aqui porque dentro de pouco tempo vou
estar em condições de ajudar os jovens que sofrem os desatinos que eu
sofri. Quero ajudar os meus companheiros de desdita. Farei tudo para que
eles também possam encontrar suas Almas Gêmeas e aprendam a amar (8).
Peço Tia, que transmita aos
seus Médiuns, que devem aprender a perdoar seus filhos e serem pacientes
com eles, como fizeram os meus pais comigo. Se não fosse o amor e a
tolerância deles eu não estaria aqui agora. É preciso que seus filhos não
sintam medo nunca! Se eu não tivesse tido certeza do perdão dos meus pais,
nunca teria voltado para casa. Teria sido vítima dos Bandidos do Espaço ou
talvez tivesse me tornado obsessora dos meus antigos companheiros.
Salve Deus Tia, e recomende aos
seus Médiuns para que contem a minha história para todos que puderem.
Agradeça aos dois Médiuns que me atenderam com tanta generosidade.
Salve Deus!
Com carinho,
A Mãe em Cristo.
Tia Neiva
Notas
do Texto
(1)
O conflito de
Maria Lúcia
tornou-se mais intenso a partir da grosseria feita por Marques ao Lucas.
Ela tentou egoisticamente viver outra vida, libertar-se da vida irregular
pela adesão ao padrão equilibrado de Marques e o desprezo pelos outros.
Entretanto essa lógica é apenas aparente. As coisas de que ela queria se
livrar existiam “dentro” dela e os antigos companheiros eram apenas os
circunstantes.
Não existe libertação enquanto
a pessoa não esclarece os “porquês”, não enfrente com coragem os próprios
defeitos e principalmente não os esconda de si mesma. Ao fazer isso, é
perfeitamente natural que haja quedas e recomeços, mas é preciso demolir
os alicerces, pois como diz Pai Seta Branca numa de suas Mensagens: “O
homem não constrói sobre os seus próprios escombros”.
Por outro lado, embora fosse
conveniente para ela abandonar a vida que levava ao lado dos antigos
companheiros, nem por isso precisava abandona-los e alimentar a
intransigência do noivo em relação a eles.
Diz o Mestre Jesus: “Se alguém
lhe pedir que caminhe com ele uma légua, caminhe duas... Se alguém lhe
pedir a blusa, dá-lhe também a camisa. Se alguém chorar, chore com ele...
Se alguém rir, ria com ele...”.
(2)
Os traficantes de
drogas são elementos
perigosos que jogam com as fraquezas humanas. A geração de nossos dias, os
meninos de hoje em sua grande maioria, são Espíritos que foram encarnados
durante o último conflito mundial, a guerra de 39 a 45. A conseqüência
disso é que eles não passaram tempo suficiente no “Sono Cultural”, não
desassimilaram a vivência terrível dessa queda civilizatória da
Humanidade.
O resultado disso é que
nasceram já aversos aos valores de nossa civilização, principalmente em
nosso país. No Brasil existe uma mescla civilizatória em que a maioria dos
valores são importados e, no seu íntimo esses Espíritos “sabem” disso e
não aceitam.
Graças a Deus nosso país já
está formando seu próprio conceito civilizatório, seu próprio conjunto de
valores. Mas enquanto isso não acontece em sua totalidade é preciso ter
muita paciência e tolerância com as novas gerações. Seu anseio de
autodestruição é apenas superficial. Se nós lhes dermos algo sólido para
se agarrar eles o fazem de bom grado. Para mudar esses meninos é preciso
antes mudarmos a nós mesmos.
(3)
Marques tinha o
orgulho do
“certinho”. O simples fato de não estar envolvido nas mazelas em que os
outros estavam, resultou na personalização de um conceito de
superioridade. Entretanto, havia mais perdão no coração daqueles meninos
desavisados do que no seu...
(4)
Essa é uma faceta
interessante do
problema do uso das drogas alucinógenas. Misturado o problema com a
mística e buscando-se informações duvidosas no passado iniciático da
Humanidade, criou-se o problema das “viagens”, resultante talvez da
vontade de libertação dos Espíritos da penosa situação de encarnados.
Na verdade o Espírito encarnado
sempre viajou por processos naturais que nunca contrariaram as Leis
Universais. Um desses processos é o sono natural, biológico.
Outra forma de “viajar” é
através dos Processos Mediúnicos, nos quais a gente pode distinguir com os
devidos cuidados o “Transporte” e o “Desdobramento”. Tais práticas, porém
são difíceis e exigem condições Mediúnicas especiais. Naturalmente exigem
variações nesses métodos, porém nunca estão afastados da idéia de
excepcionalidade – não são coisas feitas comumente por qualquer pessoa.
Nada disso existe nas “viagens”
feitas com auxílio de drogas. Nelas há apenas a alucinação da mente
concreta, do sistema cerebral e, na qual a memória desempenha o maior
papel. O Espírito não vai a lugar algum, mas a mente mergulha nos seus
escaninhos complexos, desgovernada pelo desequilíbrio que a droga provoca
no sistema enzimático.
Por um raciocínio lógico,
sempre que a mente entra em desequilíbrio, o Espírito, ao contrário do que
possa parecer, não se afasta do conjunto corpo-alma, para que não se
percam. É como um motorista cujo carro se descontrola na estrada. Seu
motorista faz tudo que estiver ao seu alcance para retomar o controle.
Agora, se o carro vai mesmo bater e o motorista puder saltar, ele o faz
mesmo. Muitos desencarnes prematuros se devem ao uso de drogas. Antes que
o Espírito corra o risco de se perder, ele abandona o corpo. Assim
procedendo o prejuízo tem possibilidades de ser menor...
O problema, porém, não termina
com a morte física. O sistema nervoso desencarna, isto é, desliga-se do
corpo físico, deixando junto com esse corpo as fibras e outras composições
celulares do “sistema”. Com a morte do corpo desaparece a distribuição
nervosa alimentadora dos sentidos. Mas a parte do sistema que segue com o
Espírito, vão alimentar os processos sensoriais no Plano para onde o
Espírito segue.
Um Espírito desencarnado,
enquanto não chega à realização plena junto a Deus, continua possuindo uma
alma, uma “Psique” em torno da qual se forma um corpo etérico. Conforme as
circunstâncias esse corpo pode ser uma réplica do corpo deixado. O mesmo
acontece com as roupas, os acessórios, etc.
Essa é a razão pela qual nossa
Noivinha teve que passar por aqueles trâmites terapêuticos, uma espécie de
psicoterapia sideral. Os sinos que ela ouvia eram formas de sacudir a sua
mente e traze-la ao equilíbrio. O mesmo aconteceu quando Januário sugeriu
que ela interviesse na briga do casal. O choque de sua participação
contribuiu para a volta à certa sobriedade da sua razão.
(5)
A célula nervosa
não se recupera como as outras células de nosso corpo. O maior perigo das
drogas alucinógenas, principalmente o álcool e a heroína, é justamente
esse da destruição celular. Pela citação do Mentor Januário, a gente deduz
que as drogas anticoncepcionais também devem causar danos semelhantes,
pois atuam no mais sofisticado mecanismo humano que é o da reprodução...
(6)
A situação de um
Espírito depois do
desencarne, varia conforme a vida que viveu. Num desencarne chamado com as
devidas reservas, de “normal”, o Espírito passa pelas exigências de seu
estado e depois “toma uma decisão”, conforme o grau de livre arbítrio que
conserva nesse período traumático. Dentre os vários caminhos “escolhidos”
ele pode ficar na Terra, numa espécie de parasitismo dos encarnados.
No caso da Noivinha, dado seu
desencarne prematuro, ela teve que permanecer três anos junto aos pais.
Essa situação foi muito dolorosa para Maria Lúcia. Embora ela estivesse na
Terra, na casa dos pais, ela pertencia a outro Plano, inferior ao dos
genitores.
Em seu Plano ela ouvia, mas não
via. O Espírito desencarnado não tem o sistema sensorial do encarnado. Ele
não vê a luz do sol e na verdade nem a luz de fogo ou elétrica. Seu mundo
é embaçado, opaco.
Os mentores permitiram a
presença de Maria Lúcia junto aos pais, porque o amor que eles tinham e a
paciência possibilitava a evolução dela. Mas depois de três anos ela já
estava começando a ser nociva para eles e o que era pior, ela já não
estava resistindo às investidas dos Bandidos do Espaço. Esses são
Espíritos também chamados de “caçadores”, que servem os Exús. Saem à busca
de Espíritos errantes e os escravizam, obrigando-os a participar das suas
vidas negativas.
A permanência de um Espírito
sofredor numa casa, quando essa casa tem alguma vida espiritual, é sempre
vigiada pelos Mentores. Às vezes eles afastam o Sofredor quando se torna
preciso e depois deixando retornar. É uma vida humilhante.
Maria Lúcia acabou sendo
amparada por Januário. Esse Espírito laborioso, nesse tempo vivia sua
roupagem de romano, daí os seus trajes. Ele fora um Doutrinador Iniciado
no Templo do Amanhecer e por isso promoveu a ida dos pais de Maria Lúcia
para lá. Ele tinha afinidade espiritual com ela.
(7)
Sempre que um
Espírito desses, que
cometem desatinos devido às condições difíceis da encarnação e depois
conseguem se redimir, compreendem o que lhes aconteceu e se dispõe a se
evoluir, os Mentores lhes dão oportunidade de trabalhar junto às pessoas
que passam pelos mesmos problemas. Com isso eles conseguem os Bônus Horas
necessários.
(8)
Como explicamos
acima, o Plano de Maria Lúcia era inferior ao dos pais. “Plano” nesse caso
significa o grau evolutivo. Às vezes os pais, tocados pela saudade,
procuravam por ela enquanto dormiam e, para isso tinham que descer até o
Plano dela.
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